Devo confessar que ponderei antes de me decidir em publicar aqui um comentário sobre este filme, por duas simples razões. Primeiro, porque "O Rapaz de Pijama às Riscas" é um típico filme sobre o qual eu gostava de escrever e, segundo, o reverso da moeda, "O Rapaz de Pijama às Riscas" é um filme difícil de se abordar, não por ser uma obra fechada em si e difícil de entender - não tem nada disso e tudo está lá muito bem documentado. Digo difícil por conter uma história tão simples, delicada, que surge por entre o caos, o holocausto, o nazismo que a II Guerra Mundial arrastou.
Existem já alguns filmes que, ao partirem de uma destruição, de uma guerra, seja ela qual for, procuram atingir um equilíbrio, uma união de sentimentos, ao fixarem-se e ao estabelecerem um paralelismo entre o caos e uma outra história, de outra natureza, que é introduzida no meio desse caos. No fundo, é o caso de "Casablanca" ou de "O Doutor Jivago" que se apropriam da guerra e do estado caótico que dela advém para nos dar a conhecer uma história de amor sem limites e que supera qualquer adversidade. Dir-se-á que se aproveitam e tomam como pretexto uma guerra, mas fixam-se numa história paralela, ficcional, e experimentam e trabalham as relações afectuosas e a forma como as mesmas podem ser condicionadas num ambiente de destruição e desequilíbrio. Quero com isto chegar, e penso que me fiz entender, que "O Rapaz de Pijama às Riscas" parte desse princípio, toma como pano de fundo a II Guerra Mundial, no seio de uma família nazi condicionada por um pai, coronel de Hitler e do seu regime que, recentemente promovido, arrasta a sua família para uma nova casa, numa nova cidade a propósito de uma missão que deve levar a cabo.
Penso que é inevitável compararmos "O Rapaz de Pijama às Riscas" com "O Império do Sol" de Steven Spielberg, indiscutivelmente um dos melhores filmes do realizador. Ambos partem da II Guerra e ambos abordam a questão do nazismo segundo a perspectiva de uma criança, apesar de serem duas perspectivas diferentes. Enquanto que o primeiro nos leva à questão mais dramática, o segundo leva-nos à questão da esperança. São filmes que têm tanto em comum como o que não têm. Ainda assim, arriscaria dizer que "O Império do Sol" ficará sempre com o lado épico que "O Rapaz de Pijama às Riscas" não conseguirá alcançar. Este é um filme dedicado ao verdadeiro sentimento da amizade, da partilha, da inocência e, principalmente, das consequências do acaso. É uma aprendizagem dura da realidade cruel do nazismo a que não ficamos indiferentes. É partir de uma fragilidade de sentimentos, de amigos deixados para trás, de um lar, de uma família, e ser atingido pelo que acreditamos não ser possível. É assistir à violência e à hipocrisia nazista.
Através de Bruno, da sua visão e consciência inocente, somos conduzidos à Alemanha Nazi, em plena e forte ditadura Hitleriana, no seio de uma família que se antevê fragmentada de opiniões em relação ao regime Alemão. Por um lado o pai (David Thewlis), acabado de ser promovido a Coronel, feições rígidas, ásperas e demasiadamente frias, é apoiado pelo seu pai, avô de Bruno. A mãe (Vera Farmiga) mostrar-se-á tão inocente quanto o filho. Segue o marido para todo o lado, apoia-o e orgulha-se do seu trabalho enquanto militar, mas desconhece do que verdadeiramente faz e para o que contribui. Há ainda a avó, única que entende Bruno e a sua singularidade, opõem-se ao regime, não esconde a sua opinião nem teme as consequências, ao passo de que a irmã Gretel, a propósito de uma paixoneta com um dos soldados do pai se vai desfazer sua própria inocência para apoiar e amar Hitler e o nazismo quase tanto como ao próprio soldado por quem se apaixonou.
A partir desta fragmentação de opiniões políticas, passamos a uma fragmentação familiar quando a promoção do pai implica a mudança de ares. A nova casa é austera, repugnante, mas Bruno avista da janela do seu quarto o que parece ser uma quinta, com crianças a brincarem e agricultores estranhos que se vestem de pijama. O momento é crucial, desperta em Bruno a curiosidade infantil, de saber o que não sabe, o que não pode e o que lhe foi proibido. Como explorador que é e que pretende ser, Bruno tece um plano que lhe permite escapar para as traseiras da casa (inicialmente só podia brincar no jardim da entrada e estava proibido de entrar nas traseiras) e explorar o que por ali podia encontrar, levando-o até à quinta que viu pelo seu quarto, conhecer outras crianças e fazer novas amizades.
Assim entramos na questão e no ponto fulcral de toda esta história, que parte de um livro best-seller de John Boyne, o momento em que Bruno conhece Shmuel, uma criança como ele, da mesma idade, com os mesmos sentimentos de infância, os mesmos desejos, e partilham um pouco da mesma inocência. A diferença é que Shmuel é judeu e está preso num campo de concentração, a "quinta" que Bruno avistara do seu quarto e que os pais proibiram de procurar.
O que acontece é inevitável, as crianças complementam-se, tecem diálogos que pouco ou nadam transmitem a condição em que estão e que tão bem os caracteriza. De um lado há um miúdo muito apessoado, imaculado, filho de um Coronel nazi, que sempre teve as mordomias ao seu dispor. Do outro lado há um miúdo faminto e sujo, vestido com um "pijama às riscas", catalogado por um número, filho de um relojoeiro judeu. Mas, a condição não é impeditiva para que uma amizade cresça. Se calhar, é precisamente essa condição que os vai unir: desde o anseio de Bruno em conhecer o desconhecido, em explorar, em saber como é a vida e por que razão Shmuel vive aprisionado naquele campo tão peculiar, até à vontade de Shmuel em voltar para casa com a família, em ter o que Bruno tem, em passar para o lado de lá da rede e viver livremente como Bruno vive. Cada um tem um anseio, um desejo que se complementa e é nesta diferença que se estabelece o equilíbrio de que há pouco falava. A busca por um sentimento maior, o valor da amizade em detrimento do caos que os rodeia.
Muito ainda se poderia dizer sobre "O Rapaz de Pijama às Riscas", mas deixarei esse muito para que cada um tire as conclusões por si só e para que se surpreenda com este filme, pelo menos, tanto quanto eu me surpreendi. Como sempre, apenas refiro que "O Rapaz de Pijama às Riscas" é tecnicamente bom, acima de tudo com actores muito bem dirigidos e uma excepcional Banda Sonora de James Horner. É sóbrio, não tem excessos e, no fundo, é o que se pretendia. Uma realização que procura o dramático através da inocência. Teria estofo para um cariz épico, tal como "O Império do Sol", mas o factor económico é sempre impeditivo nestas questões e por isso mesmo digo que ficará na sombra do filme de Spielberg.
Mas não descurem. "O Rapaz de Pijama às Riscas" é um excelente exercício sobre a condição humana, sobre os valores da amizade, da auto-descoberta da crueldade da vida, do poder do acaso. No final cabe-nos uma só pergunta, se formos racionais e não nos deixarmos levar pelo coração: Será que valeu a pena?
Penso que é inevitável compararmos "O Rapaz de Pijama às Riscas" com "O Império do Sol" de Steven Spielberg, indiscutivelmente um dos melhores filmes do realizador. Ambos partem da II Guerra e ambos abordam a questão do nazismo segundo a perspectiva de uma criança, apesar de serem duas perspectivas diferentes. Enquanto que o primeiro nos leva à questão mais dramática, o segundo leva-nos à questão da esperança. São filmes que têm tanto em comum como o que não têm. Ainda assim, arriscaria dizer que "O Império do Sol" ficará sempre com o lado épico que "O Rapaz de Pijama às Riscas" não conseguirá alcançar. Este é um filme dedicado ao verdadeiro sentimento da amizade, da partilha, da inocência e, principalmente, das consequências do acaso. É uma aprendizagem dura da realidade cruel do nazismo a que não ficamos indiferentes. É partir de uma fragilidade de sentimentos, de amigos deixados para trás, de um lar, de uma família, e ser atingido pelo que acreditamos não ser possível. É assistir à violência e à hipocrisia nazista.
Através de Bruno, da sua visão e consciência inocente, somos conduzidos à Alemanha Nazi, em plena e forte ditadura Hitleriana, no seio de uma família que se antevê fragmentada de opiniões em relação ao regime Alemão. Por um lado o pai (David Thewlis), acabado de ser promovido a Coronel, feições rígidas, ásperas e demasiadamente frias, é apoiado pelo seu pai, avô de Bruno. A mãe (Vera Farmiga) mostrar-se-á tão inocente quanto o filho. Segue o marido para todo o lado, apoia-o e orgulha-se do seu trabalho enquanto militar, mas desconhece do que verdadeiramente faz e para o que contribui. Há ainda a avó, única que entende Bruno e a sua singularidade, opõem-se ao regime, não esconde a sua opinião nem teme as consequências, ao passo de que a irmã Gretel, a propósito de uma paixoneta com um dos soldados do pai se vai desfazer sua própria inocência para apoiar e amar Hitler e o nazismo quase tanto como ao próprio soldado por quem se apaixonou.
A partir desta fragmentação de opiniões políticas, passamos a uma fragmentação familiar quando a promoção do pai implica a mudança de ares. A nova casa é austera, repugnante, mas Bruno avista da janela do seu quarto o que parece ser uma quinta, com crianças a brincarem e agricultores estranhos que se vestem de pijama. O momento é crucial, desperta em Bruno a curiosidade infantil, de saber o que não sabe, o que não pode e o que lhe foi proibido. Como explorador que é e que pretende ser, Bruno tece um plano que lhe permite escapar para as traseiras da casa (inicialmente só podia brincar no jardim da entrada e estava proibido de entrar nas traseiras) e explorar o que por ali podia encontrar, levando-o até à quinta que viu pelo seu quarto, conhecer outras crianças e fazer novas amizades.
Assim entramos na questão e no ponto fulcral de toda esta história, que parte de um livro best-seller de John Boyne, o momento em que Bruno conhece Shmuel, uma criança como ele, da mesma idade, com os mesmos sentimentos de infância, os mesmos desejos, e partilham um pouco da mesma inocência. A diferença é que Shmuel é judeu e está preso num campo de concentração, a "quinta" que Bruno avistara do seu quarto e que os pais proibiram de procurar.
O que acontece é inevitável, as crianças complementam-se, tecem diálogos que pouco ou nadam transmitem a condição em que estão e que tão bem os caracteriza. De um lado há um miúdo muito apessoado, imaculado, filho de um Coronel nazi, que sempre teve as mordomias ao seu dispor. Do outro lado há um miúdo faminto e sujo, vestido com um "pijama às riscas", catalogado por um número, filho de um relojoeiro judeu. Mas, a condição não é impeditiva para que uma amizade cresça. Se calhar, é precisamente essa condição que os vai unir: desde o anseio de Bruno em conhecer o desconhecido, em explorar, em saber como é a vida e por que razão Shmuel vive aprisionado naquele campo tão peculiar, até à vontade de Shmuel em voltar para casa com a família, em ter o que Bruno tem, em passar para o lado de lá da rede e viver livremente como Bruno vive. Cada um tem um anseio, um desejo que se complementa e é nesta diferença que se estabelece o equilíbrio de que há pouco falava. A busca por um sentimento maior, o valor da amizade em detrimento do caos que os rodeia.
Muito ainda se poderia dizer sobre "O Rapaz de Pijama às Riscas", mas deixarei esse muito para que cada um tire as conclusões por si só e para que se surpreenda com este filme, pelo menos, tanto quanto eu me surpreendi. Como sempre, apenas refiro que "O Rapaz de Pijama às Riscas" é tecnicamente bom, acima de tudo com actores muito bem dirigidos e uma excepcional Banda Sonora de James Horner. É sóbrio, não tem excessos e, no fundo, é o que se pretendia. Uma realização que procura o dramático através da inocência. Teria estofo para um cariz épico, tal como "O Império do Sol", mas o factor económico é sempre impeditivo nestas questões e por isso mesmo digo que ficará na sombra do filme de Spielberg.
Mas não descurem. "O Rapaz de Pijama às Riscas" é um excelente exercício sobre a condição humana, sobre os valores da amizade, da auto-descoberta da crueldade da vida, do poder do acaso. No final cabe-nos uma só pergunta, se formos racionais e não nos deixarmos levar pelo coração: Será que valeu a pena?
2 comentários:
Helder, não é que Astrid anda a ler este livro??? ;)
Um filme que eu penso que irias gostar é Empire of the sun, como o Christian Bale (ainda garotinho) que brevemente vai estrear na "telona" na versão do O Exterminador... O filme (do Spielberg) mostra os horrores da Segunda Guerra Mundial sob a óptica de um garoto (Christian Bale). Eu penso que já conheces, entretanto fica a dica. Podes procurar o livro também (mas penso que só em Londres)... ;)
Beijos, flores e estrelas *****
Querida Astrid,
mais uma bela coincidência!
Eu adoro o "Empire of the Sun". Aliás, eu acabei por fazer uma referência a esse filme neste comentário ao "O Rapaz de Pijama às Riscas". Anda pelo 3º parágrafo, a referência, e depois volta outra vez lá para o final do texto.
É inevitável estabelecer-se esta analogia. São visões extraordinárias da II Guerra!
O livro ainda não li, nem de um nem de outro, mas tenho muita curiosidade em ler, principalmente "O Império do Sol", escrito pelo Ballard, excelente autor de ficção científica e outros tais, infelizmente falecido à 3 ou 4 semanas atrás e que se autobiografia no "Império do Sol"... Soube disso não vai há muito tempo, curiosamente.
Quanto a Londres... há lá de tudo! Daqui a nada também me tem a mim!
hi hi!
Beijos, do
Helder
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