sábado, 28 de fevereiro de 2009

CINEMA: O Wrestler


Darren Aronofsky habituou-nos, desde cedo, a um estilo muito peculiar e excessivamente expressivo no seu cinema. Desde a sua primeira curta metragem até às longas metragens que ultimamente tem apresentado parece haver sempre uma vertente que o inspira e que o leva a fazer o que faz: a Psicologia. Associada ao ser humano, à sua consciência, à sua mentalidade e demais comportamentos, a psicologia é concerteza um dos temas mais fascinantes e mais desmistificados por Darren Aronofsky.
"O Wrestler", apesar de algum distanciamento em relação às outras obras do realizador, não foge muito da mesma linha de criação. Era de se esperar que a conotação psicológica não estivesse ao nível de "Requiem For a Dream", por exemplo. As exigências são muito diferentes e, por isso, é natural que um filme como "O Wrestler" tenha de ser feito segundo outros modelos de concepção até porque é bem provável que este filme chegue a um tipo de público diferente e em maior número do que os anteriores filmes do realizador. Ainda assim, são perfeitamente distinguíveis os traços de criação que nos fazem identificar, à distância, o autor. Não tão evidentes a nível técnico, mas a conotação psicológica, o querer-ser chegar à compreensão da mentalidade de um esteriótipo, como o desmembrar da vida de um microcosmos, de um grupo de pessoas à parte dos resto da sociedade, é bastante evidente neste filme.


"Mickey Rourke is rising again" foram as palavras de Sean Penn ao ser premiado pela Academia Cinematográfica Americana como melhor actor de 2008. Diria eu que as palavras foram muito bem proferidas, de amigo para amigo, e demonstram o bom espírito desportista de Sean Penn. Como todos sabemos, a carreira de Mickey Rourke andava a cair aos bocados, as oportunidades já lhe começavam a falhar, os narcóticos certamente que ajudavam a esquecer os maus momentos e se dizem que todos merecemos uma segunda oportunidade, Mickey Rourke teve-a aqui. Agarrou-a com tudo o que tinha para agarrar e o resultado é meritório. Não é tão bom como o de Sean Penn ou Frank Langella e, por isso, vejo a nomeação como um estímulo à oportunidade agarrada, para que agora consiga levar uma carreira mais digna. O certo é que "O Wrestler" parece ter sido um filme feito à medida de Mickey Rourke. O papel de Randy, the Ram cabe-lhe na pele com toda a perfeição ou não estaríamos perante um lutador de Wrestling em decadência. Randy teve os seus momentos de glória na década de 80. Era o verdadeiro, o melhor lutador Americano. Imortalizado pelas Figuras de Acção feitas à sua imagem, os jogos da velha consola Nintendo e pelo golpe de ataque "Ram Jam!", que levou o público a gritar pelo seu nome, Randy vê-se agora na podridão do esquecimento. Uma vida que passou a lutar. Primeiro, lutou para entreter um público e agora, luta para reaver do que foi despojado: desse público de outrora, de uma família destroçada, de uma vida perdida, de facahada e falsa, como são as lutas que protagoniza para o público que o adorou. Agora, são as lutas de esquina, as competições que os canais de televisão deprezam, e os bares de alterne que conseguem levantar a auto-estima de Randy, the Ram. É num desses bares que conhece Pam (Cassidy durante as horas de trabalho) com quem confraterniza entre cervejas e danças privadas. É ela, interpretada pela excelente Marisa Tomei, que o ajuda nos pequenos momentos em que precisa de um ombro para reflectir e pedir uma segunda opinião. Será ela o ponto fulcral da sua vida destroçada. Que o vai fazer perceber dos verdadeiros valores da vida e que tudo devemos fazer para recuperar esses valores, ainda que sejam momentos, memórias de um velho passado impossível de recuperar.
No decorrer de uma dessas lutas de público limitado, Randy sofre um ataque cardíaco que quase o levam desta para melhor. Poderá vir a ser um prenúncio, mas começa por ser um pretexto para mudar de vida. Custa-lhe a perceber isso mas Pam, ou Cassidy, ajuda-o a ver o lado certo das coisas. E assim, este lutador começa por arranjar um emprego num supermercado local e vai procurar recuperar e reatar a relação que tinha com a filha. Paralelamente, os amigos Wrestlers relembram Randy que está a fazer 20 anos desde a sua mítica luta que o levou à Glória, assistida por milhões de pessoas, umas ao vivo, outras através da televisão. Para festejar a data, organizam uma pequena competição, com os lutadores que interviram há 20 anos atrás na mítica luta e contam com a presença de Randy, the Ram para reviver a Glória de outrora. Mas o coração já não o permite a tanto esforço. Dividido entre as memórias saudosistas e a reconstrução do presente, Randy vai tentar atingir o equilíbrio entre aquilo que deseja, o fervor das lutas e o carinho do público que o relembra dos anos 80, e o sossego que o coração precisa, a união familiar e o afecto que tem vindo a ganhar por Pam.

"O Wrestler" é um filme aberto. Apesar de não ter um final concreto, somos levados a criar uma ideia bastante definida daquilo que se avizinha e suponho mesmo que essa seria precisamente a ideia do autor. Desde que começamos por perceber este Randy, the Ram, o mundo em que vive, as situações por que passa, não só ele mas também os restantes Wrestlers com quem passa a vida e a profissão, torna-se quase evidente a psicologia sobrecarregada dos restantes filmes do Aronofsky.
Não existem grandes defeitos a apontar. Pelo contrário, "O Wrestler" é curiosamente bastante diversificado nos temas por que se passeia. Não é inteiramente um filme sobre o mundo do Wrestling. Evidentemente que nos é documentado um pouco do que está por detrás da produção dos espectáculos, mas também somos largamente confrontados com problemas familiares, com a droga, a prostituição e outros tais. Por isso, quer se goste ou se odeie o Wrestling, não devemos temer este filme. É um bom filme vindo de um excelente realizador. Ficarei à espera dos restantes, "The Fighter", agendado para este ano, e do mais que aguardado remake de RoboCop, para 2010, onde já se promete uma remodelação total do filme. Ficaremos, nós por cá, à espera de ver.

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